O julgamento continuou com o voto da ministra Nancy Andrighi. A ministra citou voto da ministra Rosa Weber que diz que hierarquicamente subordinado à lei, o poder normativo atribuído às agências reguladoras não lhes faculta impor restrições à liberdade, igualdade e propriedade ou determinar alteração do estado das pessoas.
Para a minitra, quando o legislador transfere para a ANS a função regulamentar às exceções e as exigências mínimas a serem observadas pelo plano de referência de assistência à saúde, não cabe àquele órgão ampliá-las ou agravá-las, de modo a restringir ainda mais a cobertura determinada por lei, em prejuízo do consumidor aderente.
A ministra considerou que qualquer norma infralegal editada pela ANS que restrinja a cobertura de tratamento para as pessoas listadas no CID, fora aquelas hipóteses excepcionadas pela própria lei (9.656/98), extrapola os limites materiais no seu poder normativo e, portanto, configura atuação abusiva e ilegal, que coloca o consumidor aderente em desvantagem exagerada.
"Se a lei 9.656 estabelece que todas as doenças classificadas na CID estão incluídas no plano referência, só se excluem da cobertura aqueles procedimentos e eventos relativos ao segmento não contratado pelo consumidor, nos termos do art. 12 e dos incisos do art. 10. Sendo vedada à operadora, para justificar eventual negativa de cobertura, alegar outras hipótese de exclusão inseridas no contrato ou em normas regulamentares, mas que sejam ofensivas à lei."
Para a ministra, não é razoável impor ao consumidor aderente, no ato da contratação, quase 3 mil procedimentos elencados pela ANS para que ele possa decidir, no momento da contratação, sobre as possíveis alternativas de tratamento para eventuais enfermidades que possa vir a acometê-lo, como sugeriu a ANS.
A ministra indagou: "Quem de nós sabe se amanhã seremos acometidos por câncer para poder dizer antecipadamente qual tratamento estamos escolhendo?"
"Chama atenção que, ao defender a natureza taxativa do rol de procedimentos e ventos em saúde, a ANS considera a incerteza sobre os riscos assumidos pelas operadores de plano de saúde, mas estranha e lamentavelmente desconsidera que tal solução implica a transferência dessa mesma incerteza para o consumidor aderente, sobre o qual passam a recair os riscos que ele, consumidor, diferentemente daquelas operadores do plano de saúde, não tem condições de antever."
A ministra enfatizou que, em uma análise superficial dos números mostra que, a despeito do aumento das despesas da última década, mantem-se o lucro das operadores, o qual, ultimamente, gira em torno de bilhões de reais ao ano.
"Ao analisar os dados disponibilizados pela própria ANS, o Ipea concluiu que o lucro liquido per capita de planos de saúde mais do que dobrou em quatro anos e que a receita do setor aumentou mesmo com queda no número de usuários. Houve queda, os brasileiros não conseguem mais contratar os planos, mas o lucro das operadores continuou."
A ministra refutou argumentos de que a liberação de planos segmentados irá exonerar ou desafogar o SUS. "O mercado de planos de saúde dobrou de tamanho nos últimos anos, e o SUS não se beneficiou com nada disso. Pelo contrário, os planos irão empurrar cada vez mais para o SUS, os doentes que os planos não irão atender", disse.
Nancy concluiu que o rol de procedimentos e eventos do rol em saúde da ANS, enquanto referência básica para os fins do disposto na lei 9.656/98, tem natureza meramente exemplificativa, "porque só dessa forma se concretiza a politica de saúde idealizada pela Constituição".
O ministro Salomão fez um aditamento de seu voto após o voto da ministra Nancy. Confira aqui.
Ministros Paulo de Tarso Sanseverino e Moura Ribeiro seguiram a divergência inaugurada pela ministra Nancy.
Processos: EREsp 1.886.929 e EREsp 1.889.704
Manifestações
O advogado Marcio Vieira Souto Costa, sócio do escritório Sergio Bermudes, representando a FenaSaúde - Federação Nacional de Saúde Suplementar, defendeu que "ao contrário de alegações divulgadas, na verdade, o rol taxativo garante o acesso a tratamentos seguros, avaliados e reconhecidos por reguladores e órgãos responsáveis pelo atendimento à saúde, a semelhança do que ocorre em todo o mundo. A lista foi instituída com base em estudo técnico aprofundado, e que caberá ao Poder Executivo fiscalizar e regular os serviços de saúde".
Fonte: https://www.migalhas.com.br/quentes/367646/stj-define-que-rol-da-ans-e-taxativo-para-planos-de-saude